Sei que milhares de brasileiros já leram isso, mas acredito que informação nunca é demais!
Por Mary Zaidan via Blog do Noblat
O poder é uma droga forte, vicia, causa dependência. Isso é sabido. Portanto, nada mais natural do que a melancolia de um presidente quando o mandato, e ainda por cima de oito anos, se aproxima do fim. Cabe tudo. Reclamações, desconfortos, muxoxos, engasgos e até lágrimas. Mas se Dilma Rousseff é Lula reencarnado (até mesmo na cédula, como o próprio diz), lidera duas das três últimas pesquisas e já ganhou no primeiro turno - garante o Marco Aurélio Garcia, assessor especial para assuntos internacionais da Presidência -, por que mesmo Lula chora?
Assim como antecipou em quase dois anos a campanha eleitoral, Lula parece agora adiantar a dor e a tristeza de terminar o seu segundo mandato. Ainda faltam longos cinco meses, quase meio ano de trabalho para transferir a faixa. Mas ele se comporta como se cada audiência, cada viagem, cada entrevista fosse a última.
Como Lula não dá ponto sem nó, aí tem.
Nesta semana, abusou das lágrimas. Primeiro, na entrevista à TV Record, depois, ao vivo, no palanque do Gigantinho, no Rio Grande do Sul.
A capacidade de Lula para induzir e manipular emoções é indiscutível. Poucos, ou quase ninguém, tem tanta empatia e colhe tantos resultados no contato direto com o público.
Não por outro motivo, desde sempre preferiu o palanque às responsabilidades administrativas que a Presidência lhe impõe. E se, historicamente, o palanque lhe foi uma arena de domínio absoluto, tê-lo como chefe máximo da nação foi e continua sendo irresistível.
Na verdade, Lula vive uma situação bastante incomum: para a maioria dos detentores de cargos majoritários, quanto mais presidentes, o fim de um mandato os obriga a sair dos palácios e voltar aos palanques. Para Lula, especialmente se vencer com Dilma, será exatamente o contrário. Talvez esse seja um motivo de choro.
Provou isso ao embargar a voz e encharcar os olhos no comício de Porto Alegre. Mesmo sabendo que ofuscaria sua pupila, não hesitou em roubar-lhe a festa. “Faltam apenas cinco meses e dois dias”, disse, olhando firme para uma Dilma que, minutos antes, mesmo com um discurso menos técnico, feito sem teleprompter, não conseguiu animar a platéia. Já Lula, mal terminava um parágrafo, tamanha a efusão de aplausos, gritos, palavras de ordem. O que ele dizia não interessava muito. Valia só a emoção pura.
E Lula se deliciava.
Na TV Record, as lágrimas foram ainda mais abundantes. Chorou ao falar do empréstimo do BNDES à cooperativa de catadores de lixo de São Paulo. Na mesma entrevista, aí sem engasgos e com tom ameaçador, fugiu de responder à questão sobre as seis multas que recebeu do TSE. Preferiu desqualificar a revista Veja: “Não vejo essa revista”.
E foi mais longe. Depois de criticar os veículos de comunicação – “se dependesse de alguns eu teria zero na pesquisa” - não conseguiu disfarçar que entende como utilitária a relação com a imprensa: - “não preciso deles para nada”, disse, referindo-se à Veja. O que isso quer dizer? Se precisasse seria diferente?
As críticas mais amiúde à imprensa, a aposta do “nós”, o bem, contra “eles”, o mal, não são novidade. Agora, acrescentam-se as lágrimas. A incomensurável tristeza de um presidente, o mais popular que o país já teve, a quem a lei de um país democrático usurpou o direito de concorrer a um terceiro mandado.
Não passam de lágrimas de crocodilo.
Mary Zaidan é jornalista. Trabalhou nos jornais O Globo e O Estado de S. Paulo, em Brasília. Foi assessora de imprensa do governador Mario Covas. Há cinco anos coordena o atendimento da área pública da agência 'Lu Fernandes Comunicação e Imprensa
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